quinta-feira, 18 de julho de 2013
segunda-feira, 15 de julho de 2013
O bandolim de Dona Aidê: uma desculpa para relembrar...
Não,
nunca a vi tocar, sequer a ouvi, mas sei que sabia tocar o instrumento. Sei que
sabia por que ensinava minha amiga Lelê que ia
ao sótão de sua casa para aprender – meio a contragosto! O bandolim era de Dona Aidê.
Fui
algumas vezes com ela... talvez apenas uma. Lugar enorme que se chegava por uma
escada estreita. Lá em cima, cadeiras e um suporte de partitura para que Lelê
exercitasse. Eu só escutando aquele dedilhar...
Excitava-nos
a imaginação uma casa tão grande, com porão e sótão!
Dona
Aidê era professora de música. Lecionava no ginásio da cidade. Uma mulher
pequenina de altura, de corpo e de gestos. Falava baixo e não me lembro dela
brava. Adorava suas aulas.
Sempre
tive aulas de música com ela, desde o grupo escolar. Lá ensinava-nos a cantar
em cânone[1]:
após a primeira voz cantar as duas
frases iniciais, a segunda voz
começava o mesmo canto e, finalmente a terceira
e última iniciava – finalmente todos
juntos cantando aquelas vozes alternadas.
Era
uma beleza!
Desperta no bosque
Gentil primavera
Com ela chegou o canto
Gorjeio do sabiá
Lá lá lá lá lá lá lá...
Com lindos trinados
Suaves e belos
Gentis vão os passarinhos
Saudando a primavera
Lá lá lá lá lá...
Dona
Aidê tinha uma gaitinha mínima que
usava para dar o tom em que iríamos
cantar.
Fiiiiiiiiii...
De novo fiiiiiiiii... Um, dois, três... Fazia com as mãos de maestro marcando o
compasso e começávamos: Desperta no bosque...
Canto orfeônico
fazia parte das disciplinas no grupo escolar e também no ginásio. Aprendíamos a
solfejar, cantar e ler notas. Sabíamos qual era nossa voz - como eram
classificadas - se contralto, soprano, etc. era assim que éramos destinados às
vozes nas músicas. Das mais agudas às mais graves.
A
classificação se dava com a professora ao piano – da escola – fazendo os
acordes e nós, um a um, cantando as escalas: do, ré, mi, fá, sol, lá, si, dó...
e ia repetindo mais e mais agudo até onde se conseguia cantar sem desafinar.
Determinadas
as vozes, a sala era dividida em fileiras: a primeira voz, a segunda voz e a
terceira voz. Depois era só aprender a melodia de cada uma.
Ah! Sim, o bandolim...
As
aulas eram dadas no sótão da casa da dona Aidê, um magnífico sobrado na esquina
da Rua Pernambuco com a Rua Piauí, em Avaré. Entrávamos por uma área (terraço) com grades trabalhadas
em ferro fundido, passávamos pela sala de jantar e, não sei como, chegávamos à
escada.
Eu ficava fascinada pelos lindos móveis
antigos, mas não podia ficar olhando, pois minha mãe dizia que era falta de
educação. “Não se repara na casa dos outros, menina! Não é bonito!”
Nessa
foto de 2009, não dá para se ver o sótão, fica
na outra rua à direita da imagem, pois é um sobrado de esquina. Percebe-se o
porão, onde o pai de dona Aidê tocava clarinete. O sobrado, nesta foto, já está com outra aparência, tinha sido
reformado.
A
área ou terraço, não era fechada por vidros, antigamente. Onde se vê o portão
de grade, bem à esquerda, tinha uma cerca baixa de alvenaria e grades de ferro
que protegia o rio (sim ali passa um rio). A primeira janela – também de grade
– era uma porta de garagem – a entrada do porão.
Era
das outras três janelas, na sequência da foto, que se ouvia o som do clarinete
dos Sr. Manuel Afonso. Tantas vezes parei na calçada para escutá-lo... um som
claro, suave, tão agradável!
Que
bom seria se ainda hoje tivéssemos aulas de canto orfeônico nas escolas. A
musicalidade faz falta. O compasso, o aprimoramento do escutar, o distinguir
instrumentos, saber o que são “vozes” e qual é a de cada um, a complexidade de
se cantar em conjunto e onde a individualidade completa o todo...
Precisamos
relembrar Villa Lobos que introduziu
o canto orfeônico nas escolas e regia grandes multidões. Acho que foi ele quem
incentivou Dona Aidê.
Villa
Lobos esteve em Avaré em 30 de agosto de 1931. Regeu um concerto no antigo Cine
Theatro Santa Cruz. Acompanhado de sua primeira esposa e pianista Lucília, e
dos pianistas João de Souza Lima, Guiomar Novaes e Antonieta Rudge Müller, além
do violinista belga Maurice Raskin e das cantoras Anita Gonçalves e Nair Duarte
Nunes. Compunham o que se chamou a Caravana da Arte Brasileira que
percorreu 54 cidades do interior paulista que eram servidas pela Estrada de
Ferro Sorocabana.
Foi
inspirado nessa excursão que Villa Lobos teve a ideia de compor O Trenzinho do Caipira que integra as
Bachianas Brasileiras nᵒ 2 na qual o som da
locomotiva é imitado pelos instrumentos da orquestra[2].
Anísio
Teixeira, grande
educador brasileiro, naquela ocasião,
integrou-se a uma comissão do Ministério da Educação e Saúde encarregada de
estudar a reorganização do ensino secundário no país e, na condição de
Secretário de Educação, convida Villa-Lobos a organizar e dirigir a
Superintendência de Educação Musical e Artística - SEMA.
É
por ocasião dessa empreitada que Villa Lobos pesquisa instrumentos e melodias
folclóricas pelo interior do Estado de São Paulo e, animado, propõe à Vargas,
seu apoiador que institua o ensino obrigatório
de música e canto orfeônico nas escolas.
Vargas
cria em 1932, o Curso de Pedagogia de Música e canto Orfeônico ministrado por
Villa Lobos.
Não
há dúvidas das influências que isso causou pelo interior afora e da mesma
maneira que Villa Lobos conheceu nosso folclore paulista, os caipiras –
habitantes do interior – conheceram ou reconheceram uma orquestra e seus vários
instrumentos.
Também
é sabido que no interior havia Bandas Municipais que tocavam músicas populares, cujos músicos tocavam “de ouvido” ou sabiam ler
partituras. Essas bandas apresentavam-se nos coretos dos jardins e praças... Mas isso é pra outra conversa.
[1] Chama-se cânone a forma polifônica, em que as vozes imitam a linha
melódica cantada por uma primeira voz, entrando cada voz, uma após a outra, uma
retomando o que a outra acabou de dizer, enquanto a primeira continua o seu
caminho: é uma espécie de corrida em que a segunda jamais alcança a primeira.
[2]
Informações tiradas de texto do historiador Gesiel Junior. Para saber mais ver:
http://www.itaponews.com.br/v1/maiscidades/avare/2496-ha-80-anos-avare-sob-a-batuta-de-villa-lobos.html Julho 2013.
terça-feira, 9 de julho de 2013
NOVE DE JULHO
NOVE DE JULHO! FERIDADO PAULISTA...
Nove
de julho uma grande avenida paulistana e certamente nome de ruas
e avenidas de várias cidades paulistas também.
Revolução Constitucionalista de 1932 - derrubar o governo
getulista e fazer uma nova constituição – isso todos sabem.
Sim, feriado paulista – estradas lotadas, praias lotadas
mesmo com friozinho e nas montanhas uma luta para se conseguir aquele chocolate
quente...
Paulistas felizes e estressados em busca de um lugar (ao
sol?) para descansar nesse feriado que, neste ano de 2013, nos brinda (!!!) com
um feriadão, isto é...de sábado à terça-feira. País rico, sem problemas, sem a
necessidade de muito trabalhar para progredir... Mas isso é outra história.
Quero falar das memórias de meu pai para essa época de 1932.
Ele era um menino de 10 anos. Brincava na rua de calças
curtas (não era bermudas) pelas ruas, muitas sem calçamento, de sua cidade
natal – Avaré.
Entre bolinhas de gude, peões, e bola de meia, pegar
carona em carroça de leite era a diversão favorita. Claro que o carroceiro
percebia as crianças sentando atrás da sua carroça – os varões presos aos
cavalos levantavam bruscamente – mas quem ligava? Por acaso ele também não
havia feito isso quando criança?
Risadas, gritaria, correria, nem sabiam que estavam em
meio a uma revolução!
Meu pai morava perto de um grupo escolar escolhido para
ser o quartel na cidade e várias vezes ia até lá junto com os amigos para ver
os soldados fazerem as evoluções. Tudo parecia ser uma brincadeira. Não sabiam
que estavam em treinamento.
Um dia veio a notícia – “Fomos vencidos!" São Paulo
perdeu a luta e os soldados saíram da cidade às pressas não conseguindo levar
todos os seus pertences.
Aí foi a festa da criançada... Chocolates e bolachas
foram deixados pra trás assim como capacetes e até baionetas, essas enterradas
nos quintais de terra.
Essa é a lembrança dessa revolução para uma criança.
Chocolates e bolachas que não poderiam ter aparecendo como por milagre... Desenterrou
muito tempo depois – talvez 10 anos depois, uma baioneta no quintal de sua casa
que guarda até hoje juntamente com um capacete – relíquias de uma luta onde
paulistas já “iam para as ruas” por
um Brasil melhor.
terça-feira, 2 de julho de 2013
TORNAR-SE ESCRITORA
Escrever para mim se tornou
primordial. Divulgar e difundir as pesquisas que venho fazendo é um dos
objetivos que procuro atingir.
O texto que coloco a seguir faz parte do meu
segundo livro Arari´wa: escola na mata[1] que teve como base minha dissertação de mestrado.
O livro
conta a
história da Reserva Indígena de Araribá no oeste paulista e a “luta” dos
indígenas que lá residem para manter sua cultura. A questão
escolar é também discutida no livro assim como a legislação nacional sobre o
tema.
Caminhos da Pesquisa
O
exótico deixou de ser distante e o distante torna-se cada vez mais familiar. [...] longe de serem obstáculos perturbadores, o multiculturalismo e a plurietnicidade são verdadeiros pilares de uma integração social democrática (Delors,
2003, p. 246 e 249).
Da minha experiência
como professora de Artes e Cultura surgiu o interesse de pesquisar a arte e a cultura
indígena, particularmente dos índios do Estado de São Paulo. Esse interesse
cresceu na medida em que tomei conhecimento da grande diversidade de culturas e
povos existentes nesse Estado e do desconhecimento sobre eles por parte da
sociedade.
Passei, então, a
procurar informações sobre esses povos, suas tradições, línguas, costumes
aproveitando também meus conhecimentos em cultura popular e semiótica, buscando
apreender mais profundamente essas culturas.
O levantamento das
questões legais sobre a temática indígena no Brasil e de como a escolarização
se desenvolveu ao longo desses 500 anos de vida nacional foram os próximos
passos. Completei as pesquisas com enfoque no Estado de São Paulo onde, além da
legislação, busquei a localização dos povos indígenas, as etnias aqui
existentes, sua cultura, costumes e línguas. Contextualizando e aperfeiçoando o
direcionamento do trabalho cheguei à Reserva Indígena de Araribá, configurando
como foco da pesquisa a educação escolar indígena no Estado de São Paulo com
estudo de caso na Reserva de Araribá.
Estudar a Reserva foi
um processo muito prazeroso, pois, além de conhecer sua história, levantei também
a história cultural dos povos que ali habitam e de sua trajetória até se
fixarem neste local. Entrelacei a história da construção da ferrovia Noroeste
do Brasil com o aldeamento dos Guarani - por Curt (Nimuendaju) Unkel -
primeiros habitantes de Araribá no início do século XX, levantei a questão da
Lenda da Terra sem Males para melhor entender os costumes desse povo,
compreendi a permanência dos Terena e sua função de “professores” de
agricultura para os Guarani, levantei o decreto de homologação da Reserva e
reconstruí seu mapa, com o auxílio de um geógrafo e, assim, fui construindo a
história da Reserva Indígena de Araribá e de seus habitantes.
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