Foto da Verônica na procissão do Enterro em Atibaia, 1961.
No assim denominado Ciclo
da Quaresma pelos estudiosos da cultura popular, algumas tradições,
crendices e superstições ainda são encontradas pelo Brasil afora. Em alguns
lugares mais que outros, com aspectos diferentes, personagens diferentes, porém
a raiz cultural permanece.
Assim, na Semana Santa, como na Quaresma toda, acontecem,
a cada dia dessa semana, ritos diferenciados, uns derivados de textos do
Evangelho outros de costumes populares europeus sendo que o que os une é o
período sagrado.
“Foi no século VIII
que se estabeleceu, em Roma, a proibição de tocar sinos nesse período” (de
5ª a sábado) [...] ao ser divulgada essa interdição na França, “acrescentou que os cristãos deveriam se
contentar em bater pedaços de madeira, recordando o que faziam os fiéis
refugiados nas catacumbas, por falta de sinos. Em consequência, surgiram vários
tipos de matracas” como relata Rossini Tavares de Lima.
Enquanto lecionava cultura popular, fui registrando
vários costumes que meus alunos
relatavam. Colocarei aqui alguns reincidentes – ou seja – aqueles que mais
apareceram em referência a cada dia da Semana. Lembrando que são costumes,
tradições que as pessoas mantêm.
A Semana Santa se inicia com o Domingo de Ramos: vai-se às missas levando palmas para serem
benzidas – é a celebração da entrada
de Jesus em Jerusalém, quando seus discípulos e os peregrinos que os esperavam
estendiam seus mantos e túnicas para que Jesus passasse por cima. Aqueles que
não tinham mantos arrancavam ramos de palmeira, estendiam na passagem formando
um verdadeiro tapete. Essas palmas são utilizadas para muitas coisas,
especialmente quando há tempestades e trovoada. “Usam para benzer doentes e
para defumar a casa; afastam as tentações e os temporais”.
Na segunda–feira e na terça-feira faz-se a Via Sacra visitam-se sete igrejas (se
não tiver sete igrejas entra e sai sete vezes de uma só) ou fazem-se os 14
passos de Jesus “para ganhar o céu, para não ficar muito tempo no Purgatório”.
Na quarta-feira assiste-se
o ofício das Trevas: o dia em que Jesus foi vendido por 30 dinheiros ou o
dia em que os apóstolos fugiram deixando Jesus sozinho;
Na quinta-feira
é o Lava-pés
– o dia da malvadeza, pessoas invadem currais (nas fazendas) e soltam o
gado, na cidade, rapazes mudam as coisas de lugar: vasos de flor, latas de lixo,
etc. “Porque Nosso Senhor estava doente,
a casa não se varria, os escravos não trabalhavam, os meninos não faziam bulha.
Não se cantava, não se dançava, não se tocava. [...] falava-se baixinho,
jejuava-se, rezava-se...” registra Mello Moraes Filho.
Na sexta-feira,
Paixão e Morte - o Enterro – é o dia dos furtos, pois Jesus está morto e não pode
ver. “O roubo nunca se efetivava para prejudicar alguém, mas apenas por
brincadeira. Roubam galinhas e no sábado faz um banquete com elas, convidando o
dono das galinhas também”.
Sábado, à
noite, a Aleluia, a ressurreição.
“Na missa de sábado fazia-se um silêncio absoluto na hora da elevação para que
o padre visse as aleluias voando sobre o cálice, que como se sabe são uns
bichinhos parecidos com mariposa, de barriga compridinha. Elas queriam avisar
que Jesus tinha ressuscitado. As pessoas que diziam ter visto as aleluias eram
consideradas privilegiadas”.
Domingo
de Páscoa – ovo é vida, é o símbolo da volta de Jesus à
vida. Antigamente (e ainda hoje em alguns lugares) os ovos eram de galinha
cozidos e pintados de várias cores. “Entre 1913 e 1920, os padres alemães que
estiveram em Perdões distribuíram ao povo, no domingo de Páscoa, ovos cozidas
de galinha – uma tradição alemã introduzida nas cidades do Brasil. Dizem que os
coelhos os trazem porque, no estrangeiro, o fim da semana Santa corresponde ao
fim do inverno e começo da primavera, ocasião em que os coelhos saem das tocas
levando alegria e nova vida a todos os lares”.
Existem ainda as proibições alimentares como não se comer
carne, leite, ovos e manteiga. “Não se como nenhum produto animal e peixe
somente os pequenos que não vertem sangue. Não se deve comer carne de animais
com sangue quente em todas as sextas-feiras da quaresma”.
Costumes,
tradições, cultura! Preservá-las e transmiti-las faz com que conheçamos cada
vez mais nosso Brasil, suas histórias, seu povo e a construção dessa
pluralidade tão rica.
A foto colocada ilustrando esse texto está em: LIMA, Rossini Tavares de. Folclore das festas cíclicas, p. 34.
ResponderExcluir